*Texto especial aprovado no Encontro Nacional dos Servidores do MP de 2024

Existe hoje nos Ministérios Públicos estaduais, um movimento que vem se fortalecendo no sentido da apropriação da instituição por parte de uma parcela dos seus integrantes. Usando um discurso de fortalecimento da democracia interna, mas que na realidade expressa o corporativismo dessa parcela da instituição, esses integrantes do parquet vem conseguindo direcionar uma parte cada vez maior do orçamento ministerial para os seus próprios bolsos.

A cada leva de novas nomeações de promotores e promotoras de justiça, mais explícito fica o corporativismo e o patrimonialismo que motiva e mobiliza essa categoria de agentes públicos que possui acessos, contatos e poder para se tornar “sócia” do Estado. Assim, o MP passa a se pautar pela ganância e apropriação de recursos públicos. Esse tipo de prática abre espaço para descrença da sociedade frente ao MP e ao sistema de justiça como um todo.

Quanto à atuação institucional, a missão constitucional e as expectativas da sociedade, o que se vê hoje é que basta dar conta de “zerar” os sistemas eletrônicos de aferição de resultados, sem qualquer preocupação com os impactos sociais dessas atuações. O cuidado com a sociedade, mesmo entre aqueles promotores e promotoras que desejam dar a sua contribuição social, acaba sendo distanciado da realidade, visto a mediação social se dar prioritariamente por meio de trabalhadores super precarizados (terceirizados e cargos comissionados). A quantidade de demandas, o rigor e as dificuldades apresentadas pelos sistemas, a precarização das equipes de trabalho, a desvalorização dos servidores efetivos e o assédio institucional sobre os trabalhadores, empurram a instituição rumo à burocratização, desumanização e alienação.

Nesse processo de sequestro do orçamento do Ministério Público, a categoria em questão aposta na ampliação da precarização das relações de trabalho e na automatização das atividades como formas de ampliar sua participação no orçamento e de fragilizar as relações entre as categorias que constroem o parquet. A todo tempo surgem notícias e medidas concretas de direcionamento de recursos para os privilegiados, com a finalidade de permanência no poder por parte das gestões ministeriais, afinal são os tais privilegiados que elegem as gestões dos MPs. Dessa forma, a cada ano, a parcela orçamentária destinada a remunerar e indenizar promotores e procuradores de justiça vai aumentando, enquanto isso, as gestões ministeriais ficam, cada vez mais, reféns dessa parcela da instituição.

No Ministério Público de Pernambuco, por exemplo, esse movimento iniciou em 2010, quando os promotores de justiça obtiveram a permissão legal de alçarem o cargo de Procurador-Geral de Justiça (chefe da instituição). Esse processo vem se intensificando de forma nítida após novas medidas de “democratização do MPPE”, uma delas, permitindo o Promotor de Justiça se tornar Corregedor-Geral de Justiça (fiscal do trabalho dos procuradores e promotores), tudo isso, basicamente alijou da gestão ministerial os procuradores e procuradoras de justiça. Desde então, em Pernambuco, são escolhidos apenas promotores de justiça para chefia do Ministério Público Estadual. Esses promotores de justiça têm seus programas pautados quase que estritamente em pautas corporativas, como: a venda de férias e de licenças prêmio (que deveriam ser gozadas compulsoriamente, segundo o TCE/PE), o pagamento de gratificações de acervo (que premiam exclusivamente os promotores/procuradores, em detrimento da equipe que efetivamente trabalha); o retorno do pagamento dos ATS (adicionais de tempo de serviço), e agora a indenização pela realização de sessão do tribunal do júri, entre outras benesses.

No Ministério Público de São Paulo o fenômeno é parecido sob o slogan “MP resolutivo”, com um discurso produtivista sobre o trabalho que é realizado especialmente por servidores e com o crescente interesse por trabalhadores comissionados por possuírem menos direitos e menos resistência a chefias. E, muito embora haja a discussão de democratização do MPSP, com redes de combate ao racismo, à homofobia etc, as esferas decisórias sobre orçamento e organização do trabalho continuam sendo totalmente controladas por promotores e procuradores de justiça. Assim, o orçamento do MPSP é esvaído em auxílios para membros, como auxílio-livro, auxílio-acervo, bem como diárias, plantões, acúmulo de funções, venda de férias de dois meses e toda a sorte de nomes para novas verbas ao largo do subsídio normal, com alguns membros recebendo sozinhos mais de 400 mil reais por mês.

É preciso destacar que esses pagamentos/remunerações não implicam necessariamente em ilegalidades, mas, em questionável moralidade a partir do momento em que colocam as gestões ministeriais a mercê desses compromissos corporativos para figurarem nas listas tríplices, e comandarem a instituição. É nítida a opção pelo desmantelamento das carreiras efetivas de apoio técnico, cuja implementação foi uma conquista da sociedade e da própria instituição no sentido da sua profissionalização. 

Voltando ao caso do Ministério Público de Pernambuco, apenas nos últimos 03 (três) meses do ano 2023, foram repassados mais de cento e dezessete milhões de reais para promotores e procuradores de justiça, tendo havido quem recebesse mais de cento e setenta mil reais, líquidos, em um único contracheque. Enquanto isso, uma parcela super explorada da instituição, os trabalhadores terceirizados, que muitas vezes atuam em desvio de função no exercício de atividades típicas de servidores efetivos, sofrem diversos tipos de assédio e pressão para atenderem aos desvios impostos contra si. 

Ao mesmo tempo, os servidores efetivos do MPPE deixam de receber as horas extraordinariamente trabalhadas por anos, sendo obrigados a converterem as mesmas em folgas (que não observam o acréscimo mínimo de 50%), e veem a instituição se apropriar de mais de quatro milhões de reais que deveriam ser destinados à indenização de tais horas extras.

A seguir o rumo atual, a previsão é o desmantelamento das carreiras efetivas de apoio técnico e a ampliação cada vez maior da força de trabalho super precarizada, ao mesmo tempo em que promotores e procuradores de justiça se locupletarão mais e mais do orçamento do Ministério Público. Enquanto isso, a sociedade fica sem conseguir acessar os serviços que o MP deveria prestar, vendo suas demandas cada vez mais automatizadas e em grande parte sem solução .

Assinam: 

ANSEMP – Associação Nacional dos Servidores do Ministério Público

FENAMP – Federação Nacional dos Trabalhadores dos Ministérios Públicos Estaduais

SIMPE/RS – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul

SIMPE/SC – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado de Santa Catarina

SINDSEMP/BA – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado da Bahia

SINDSEMP/MA – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado do Maranhão

SISEMPPA – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado do Pará

SINDSEMP/PB – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado da Paraíba

SINDSEMP/PE – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado de Pernambuco

SINDSEMP/SE – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado do Sergipe

SINDSEMP/SP – Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado de São Paulo

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